Faça da educação uma arma e não da arma uma educação

01 de Agosto de 2019

[Por: José Neivaldo de Sousa]




“A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo” Nelson Mandela

 

Há meses, escrevi um texto, publicado no site da Ameríndia, sob o título: “De que são feitos os dias?”. Evoquei e ressuscitei do mundo das ausências, a nossa Cecília Meireles. Suas palavras, presença na ausência, me ajudam a pensar nestes dias de descontentamento e falta de esperança em relação ao futuro da educação. Numa época em que a educação era monopólio de poucos e a escola um grande negócio, Cecilia Meireles assinou um Manifesto a favor de uma nova educação. Defendendo uma escola pública, gratuita, laica e obrigatória, ela entendia que a pessoa só pode se desenvolver integralmente se tem acesso à escola e à uma formação intelectual crítica e libertadora.  

 

Há em mim um pouco de Cecília: revolucionária e poeta! Uma, contesta, a outra faz poesia. Uma, preocupada com a idade; a outra, de olho na eternidade. Às vezes dissonante, às vezes consoante. Os dias são ruins? Depende de quem os vê, pois “dentro deles vivemos; dentro deles choramos; em duros desenlaces e em sinistras alianças". É em momento de choro e em duros desenlaces que pergunto sobre o futuro da educação e da escola no Brasil. 

 

Sugestivo é o filme “A língua das mariposas” de José Luiz Cuerda. Aborda o contexto de mudanças sociais e políticas que proporcionaram a guerra civil espanhola e a subida ao poder do ditador Franco. Uma criança vai para à escola e, no primeiro dia de aula, se vê amedrontada diante do professor e dos novos colegas que debocham de seu apelido: “pardal”. Fugindo desesperadamente vai se refugiar na mata, até que é encontrada à noite. 

 

Dom Gregório, o professor, sentindo a sua falta, vai se desculpar e, a partir deste dia, começa uma grande amizade com a família. O garoto passa a se interessar pela escola e se encanta com o mestre cujo método: não avalia o aluno em função do saber, mas o saber em função do estudante. Uma pedagogia à contramão do poder da época representada pelos militares, a igreja e os fazendeiros. Tudo vai bem até que o General Franco sobe ao poder e instaura uma ditadura. Vem a censura, repreensão e prisão pública de professores acusados de serem comunistas e ateus. O medo da perseguição leva os pais do menino a se posicionarem contra os opositores do poder e particularmente ao professor Gregório. Insuflado pela mãe, vendo-os repreender publicamente os presos, o menino aprende que o professor representa uma grande ameaça à sua família e à vila onde ele mora. 

 

O filme termina focando os dois personagens: o professor a criança. Ele, levado juntamente com outros sobre a carroceria de um caminhão e o garoto, juntamente com a meninada da escola, xingando e atirando pedras sobre os presos. Dom Gregório, impotente diante daquela situação, só pôde lamentar. Assim começa a guerra civil espanhola.

 

Analisando o filme e a ditatura franquista, concordo com uma frase que li, mas não sei quem escreveu: “basta um dia ruim para reduzir o mais são dos homens a um lunático”. Hoje presenciamos o retorno de uma ideologia autoritária, violenta e militarista ao redor do mundo, parecida com aquela que conduziu uma parte da humanidade à barbárie. As pessoas renunciam à sua dignidade em favor do medo e das promessas de salvação, pois são levadas a entender que o inferno são os Direitos humanos. Elas não sabem que “as razões do poder transformam crimes em heroísmo”1. É preciso uma tomada de posição em favor da liberdade de expressão, de defesa da democracia e de mudanças sócio-políticas em favor da vida. Todos são convocados a dar o seu tempo e sua contribuição para a construção de uma cultura onde justiça e paz se abraçam. 

 

Apesar dos dias ruins, o infinito me convoca a não desanimar, ter paciência; a pressa é inimiga do tempo. O universo gira e tudo se ajeita conforme a ordem natural das coisas. Enquanto isso, se em momentos de tristeza, como os de Cecilia, vou contestando e escrevendo àqueles que constroem gaiolas, em momentos de alegria e com o espírito de poeta, posso ver o infinito e, apesar dos maus dias, dizer: “felizes os que fazem da educação a arma mais poderosa para a transformação do mundo”.

 

Nota:

 

1 ALVES, Rubem. 300 pílulas de Sabedoria. São Paulo: Planeta, 214, p. 66.

 

 

Imagem: https://sincroguia-tv.expansion.com/peliculas/a-lingua-das-bolboretas--5hm-GLG 

 

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