18 de Enero de 2019
[Por: José Neivaldo de Souza]
Terça-feira, 15/01/2019, Jair Bolsonaro assinou um decreto que flexibiliza o uso de armas de fogo. Ainda que este trate mais especificamente da “posse”, e não do “porte”, não acredito que todos os cidadãos, que possuem um revólver em sua residência, ou em local de trabalho, vão deixar de andar armados na rua. A afirmação do presidente de que “o povo decidiu por comprar armas e munições e nós não podemos negar o que o povo quis nesse momento", parece ser contraditória. Que povo? Apesar das regras, há questões a serem questionadas por pelo menos 56% dos brasileiros que, segundo o Datafolha, são favoráveis ao desarmamento.
Eis um critério a ser debatido: tem direito o cidadão que, acima de 25 anos declara efetiva necessidade, pelo fato de morar em uma cidade ou um Estado onde a taxa de homicídios é superior a 10 para cada 100 mil habitantes. Ora, considerando os dados do Ipea e do Forum Brasileiro de Segurança Pública (Atlas da violência 2018), não há Estados com taxa inferior. O Estado de São Paulo apresenta o menor índice (10,9) e Sergipe o maior (64,7). Em 2016 o Brasil foi contado entre as nações mais violentas do planeta com mais de 70% dos assassinatos com armas de fogo. As “supostas” dificuldades para a sua aquisição facilitarão mais ainda o mercado negro.
Há uma luz no final deste túnel escuro e inseguro? Vou aos evangelhos e me deixo guiar pelo Espírito de Jesus. A Palestina, na época, contava com uma alta taxa de criminalidade, devido a um sistema desigual e injusto. Os governos seguiam a cartilha do Império Romano. Herodes, rei da Galileia, apesar de acreditar em Deus, idolatrava César; os sacerdotes do Sinédrio (Tribunal), apesar da Lei da misericórdia, eram coniventes com as sentenças injustas do procurador da Judeia. A polícia romana, sob as ordens do capitão do templo, servia ao Procurador e tinha ordem para prender, torturar e matar “os bandidos”.
Era lícito aos latifundiários explorarem os camponeses e a maioria trocavam seu trabalho por comida e outros chegavam a ganhar 1 denário ao dia trabalhado, o que corresponde, nos dias de hoje, a R$ 30,00. Esta situação levava ao êxodo rural. Muitos emigravam para as cidades em busca de melhor condição de vida engrossando a fila dos marginalizados. Sem recursos para moradia, alimentação, vestuário, educação, segurança, saúde etc., havia mendigos, prostitutas, ladrões e, não poucos desesperados, arrumavam jeitinhos ilícitos para sobreviver. O medo da violência levava a população a aceitar, de bom grado, os decretos dos governos sobre segurança pública. Paul Valéry diria: “as pessoas boas desejam, sem saber, toda a infelicidade do mundo ao “mau sujeito”.
Jesus questionou os Poder político-religioso. Ele propôs um novo reino que, apesar de não ser deste mundo, começa aqui. Neste reino, a paz é fruto da justiça e do amor e não da violência das armas. Os critérios deste Reino são:
1. O Poder vem de Deus! Esta afirmação, não é só uma teoria para agradar uma elite religiosa, como faziam Herodes e Pilatos, mas uma prática de vida. Misericórdia, não sacrifícios; sabedoria de Deus, não violência (Os 6,3). O Mestre, lembrando o Provérbio que dizia: “destruição é o que planejam no coração, e só falam de violência” (Pv 24,2), mandou Pedro embainhar a espada: “Pois os que empunham as armas, pelas armas morrerão” (Mt 26,52).
2. Poder é serviço! Quem não serve não pode exercer bem o poder. Jesus ensinou aos discípulos: “entre os gentios, os poderosos são chamados de benfeitores. Mas, não sereis assim, pelo contrário: que o maior seja o menor; que o governo seja exercido como serviço” Lc 22, 25-26). Jesus sofreu na carne a ação violenta do Poder na época.
3. O Poder vem do povo! Jesus organizou a nova sociedade a partir de uma multidão de famintos, aviltados em seus direitos. Como solucionar o problema da desigualdade e da injustiça? Ele ensinou a multiplicar o pouco com muitos e não dividir o muito com poucos (Mc 6, 34-42).
O que diria Jesus na situação em que se encontra o nosso Brasil? Diria aos discípulos que aplaudam os que incentivam a população a matar bandidos? Quem são os bandidos? Penso nos índios que, para se defenderem das armas pesadas dos grileiros e mineradores, usam seus artefatos de caça e pesca; penso nos trabalhadores do campo cuja produção é constantemente ameaçada, não pelos ladrões de galinha, mas pelo poder gigantesco do agronegócio. Assim como o Mestre, é preciso questionar o poder. A quem ele serve? À justiça e igualdade entre as pessoas ou aos gigantescos negócios, entre eles o belicismo.
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