Peregrinos de esperança: Ministros/as leigos/as da Palavra de Deus!

10 de Febrero de 2025

[Por: Emerson Sbardelotti]




A Palavra de Deus é a fonte que de onde jorra nossa vocação, nossa missão, nossa alegria e esperança no seguimento a Jesus de Nazaré.

 

Do Primeiro ao Segundo Testamento e chegando até os nossos dias; a Palavra de Deus sempre esteve viva e revolucionária. Transformando vidas, inspirando profetas e mártires... Testemunhas das causas da vida nas causas do Reino da Vida.

 

Segundo o Dicionário do Concílio Vaticano II: “Ministério é a tradução portuguesa do termo latino ministerium, que, por sua vez, traduz o grego diakonia, significando, no Novo Testamento, serviço ou o serviço das mesas (cf. Lc 10,40)” (ALMEIDA, 2015, p. 617-618).

 

O Ministério da Palavra exercido por leigas e leigos no cotidiano das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) celebra a obra de Deus realizada em Jesus de Nazaré. Ao prestar este serviço seguem o Mestre na arte de servir, e todo o povo vê naquelas mulheres discípulas missionárias e naqueles homens discípulos missionários, sinais da presença de Deus nas CEBs. Enquanto peregrinos e peregrinas de esperança, os ministros e as ministras da Palavra são convidados e convidadas a experimentarem e a testemunharem na vida do povo, a Palavra de Deus proclamada no Dia do Senhor.

 

O Diretório para a Catequese afirma: “Os leigos, testemunhando o Evangelho em diferentes contextos, têm a oportunidade de interpretar cristãmente os fatos da vida, de falar de Cristo e dos valores cristãos, de dar razão de suas escolhas” (DCq 121).

 

O ministro da Palavra, a ministra da Palavra, é aquele e aquela que aprendeu a escutar. Escutar a Palavra de Deus através da leitura da Bíblia, para anunciar as maravilhas do Deus da Vida para todo o povo. Porém, precisamos alimentar o silêncio dentro de nós. Não basta o silêncio de fora, é preciso silenciar dentro de nós. Somente assim poderemos entoar aquela cantiga de Lulu Santos[1]: “Eu te amo calado, como quem ouve uma sinfonia de silêncio e de luz. Nós somos medo e desejo, somos feitos de silêncio e som. Tem certas coisas que eu não sei dizer”.

 

Para Carlos Mesters e Francisco Orofino[2]: “Os Ministros da Palavra têm uma função mediadora. Eles são representantes da Palavra de Deus junto ao povo, e do povo junto a Deus. Em todo canto, sempre aparecem pessoas que se sentem chamadas para exercer essa missão mediadora entre Deus e nós, seres humanos. Elas procuram responder ao desejo profundo de Deus que existe escondido no coração humano. Querem fazer algo para que em todos possa acordar a saudade de Deus, de que falava Santo Agostinho: “Tu nos fizeste para Ti, e nosso coração estará irrequieto até que não descanse em Ti” (Confissões 1,1). Nessa missão como ministros e ministras da Palavra temos Jesus como guia e modelo, pois, como diz o evangelho de João, foi em Jesus que “a Palavra se fez carne e habitou entre nós” (Jo 1,14). Sua vida e seu testemunho mostram como e o que devemos fazer para ser um bom ministro, uma boa ministra, da Palavra. Para o apóstolo João ser Ministro da Palavra era testemunhar para os outros o que ele, João, durante aqueles três anos de convivência com Jesus, pôde ouvir, contemplar e apalpar “da Palavra que é a Vida” (1Jo 1,1-4). O ministro irradia para os outros algo da experiência que ele mesmo tem de Jesus. Só pode trabalhar com a Palavra quem se deixa trabalhar pela Palavra, que é o próprio Deus. [...] Hoje em dia, para saber se alguém pode ser ministro da Palavra na paróquia, observa-se primeiro como ele vive e pratica a Palavra de Deus. Pois se ele mesmo não vive bem a Palavra de Deus, como é que ele pode ser ministro da Palavra? Somos ministros não só quando exercemos nossa missão na missa ou na celebração da Palavra na comunidade. Nem só quando o povo nos ouve explicar a Palavra de Deus na igreja. Somos ministros da Palavra sempre: quando exercemos a função de ministro na igreja e também quando descansamos em casa ou andamos na rua. Isso também vale para Jesus. Muitos gestos narrados nos evangelhos refletem a maneira como Jesus vivia e praticava a Palavra de Deus, não só na sinagoga, quando falava ao povo durante as celebrações, mas também quando ele conversava com o povo na rua ou visitava as pessoas em suas casas; ou quando trabalhava na roça, andava de barco para o outro lado do lago ou descansava em casa com a família. Jesus era a Palavra viva de Deus para todos (MESTERS & OROFINO, 2021, p. 7-8; 19-20).

 

Em um outro momento, Carlos Mesters[3] afirma: “Na raiz da leitura que Jesus fazia da Escritura, estava a sua experiência de Deus como Pai. A intimidade com o Pai dava a ele um critério novo, um olhar mais penetrante, que o colocava em contato direto com Deus, o autor da Bíblia. Jesus ia buscar o sentido na fonte. Ele, por assim dizer, não ia da letra até a raiz, mas ia da raiz até à letra. [...] O Novo Testamento é uma releitura do Antigo Testamento feita à luz da nova experiência de Deus como Pai e Mãe, revelada, vivida e partilhada a nós por Jesus. Era muito importante que esta nova chave de leitura da Bíblia penetrasse nos discípulos e fosse assumida por eles como expressão da sua pertença à comunidade de Jesus, pois a Palavra de Deus não é uma doutrina distante de difícil acesso, nem um catecismo de verdades a serem decoradas e impostas aos discípulos. A Palavra de Deus é o próprio Deus, querendo comunicar-se conosco como Pai amoroso. O valor da Bíblia não está só naquilo que ela diz e ensina. O seu valor está também, e sobretudo, em Deus, Ele mesmo, a sua pessoa que pronuncia com muito amor aquilo que nela é dito e ensinado. Era esta experiência do próprio Deus como Pai que revelava a Jesus o sentido pleno das Palavras da Escritura. O mesmo vale para nós hoje. Não basta ler e estudar a Bíblia para que ela libere o seu sentido. É preciso ter em nós os mesmos sentimentos que animavam Jesus (Fl 2,5); ter nos olhos e no coração, a liberdade dos filhos de Deus que Jesus nos comunica. Do contrário, como diz São Paulo, a Bíblia continua coberta por um véu que impede a descoberta plena do seu sentido. “É só pela conversão ao Senhor que o véu cai. Pois o Senhor é Espírito e onde há o Espírito, aí há liberdade” (2Cor 3,17). O texto bíblico é como uma lâmpada (Sl 119,105). O estudo do texto limpa a lâmpada por fora, tira a poeira que ofusca o brilho. A nova experiência de Deus, vivida na comunidade formadora, é como a força elétrica que acende a lâmpada do texto pelo lado de dentro e produz luz que ilumina a vida. Foi só depois da ressurreição que esta experiência nova de Deus e da vida entrou de cheio nos olhos dos discípulos (cf. Lc 24,33.44-48). [...] O grande conflito de Jesus com as autoridades religiosas da época era sobre a correta leitura e interpretação das Escrituras. A leitura diferente que Jesus fazia da Bíblia foi um dos motivos mais fortes que levou os adversários a procurar a morte de Jesus (Mc 14,60-64). Neste conflito com as autoridades sobre a leitura da Escritura, há três aspectos a serem considerados: a) Jesus desfaz as interpretações erradas, b) apresenta uma nova interpretação do Projeto de Deus e c) usa um novo método de leitura” (MESTERS, 2012, p. 65-67).

 

Muitas pessoas me perguntam como eu me preparo para servir bem o Povo Santo de Deus enquanto ministro da Palavra no Dia do Senhor, eu respondo que ler e meditar, com calma, a Palavra de Deus é o primeiro passo. Entendendo o contexto em que foi escrita aquelas leituras daquele Domingo, ligando-as com a realidade atual em que está inserida a comunidade e as pessoas que dela participam. Neste processo, vou cantando músicas litúrgicas de acordo com as leituras, a poesia e a música me ajudam demais a preparar a Homilia / Partilha da Palavra. Durante a semana que antecede ao Domingo em que estarei servindo, eu uso o Método da Leitura Orante da Bíblia: a Lectio Divina.

 

Dilza Pacheco e Penha Carpanedo[4] ensinam os passos da Leitura Orante da Bíblia:

 

1.   Leitura: O primeiro passo é tão determinante que deu nome ao método (lectio divina). Trata-se de uma leitura atenta e perseverante... Ler e reler, calmamente, até centrar-se totalmente no texto. Ler como se fosse a primeira vez, procurar compreender o que o texto diz em si mesmo: observar palavras-chave, imagens, personagens, ações, sentimentos. Se durante a leitura ocorrer a lembrança de outro texto bíblico, ou de um fato da vida, seguir atentamente o que vem à memória... Entrar em relação com o texto e, por meio dele, com o autor do texto. Quando o texto se torna familiar a tal ponto que vemos nele o espelho de nossa própria vida, é o começo da meditação...

 

2.   Meditação: Meditar é guardar, repetir, compreender, saborear, ruminar a Palavra, como diziam os antigos, ou como fazia a mãe do Senhor que “guardava cuidadosamente todos os acontecimentos e os meditava no coração” (Lc 2,19). A Palavra é uma presença que se dá a conhecer, iluminado, consolando, exortando, levando ao discernimento e à conversão... Como no encontro de Jesus com os discípulos de Emaús, ela revela o sentido oculto dos fatos (cf. Lc 24). Ou conforme diz a Carta aos Hebreus: “A palavra de Deus é viva, eficaz e mais penetrante do que qualquer espada de dois gumes; penetra até dividir alma e espírito, junturas e medulas. Ela julga as disposições do coração. E não há criatura oculta à sua presença. Tudo está nu e descoberto aos olhos daquele a quem devemos prestar contas” (Hb 4,12-13). Contudo, nada deve ser forçado, apenas um coração atento e dócil a esta presença. Este encontro vital aquece o coração, faz brotar um silêncio amoroso que conduz à oração.

 

3.   Oração: A oração se traduz em silenciosa admiração, agradecimento, intercessão, arrependimento, louvor, súplica... Faz-nos permanecer em comunhão com Deus, firmando em nós o desejo de “ter os mesmos sentimentos de Cristo” (Fl 2,5) ou de buscar o que ele recomendou: “Ser perfeitos como o Pai do céu é perfeito” (cf. Mt 5,48). Estamos passando à contemplação.

 

4.  Contemplação: É ponto de chegada e novo começo. Não se trata de tirar conclusões práticas, como se a conversão fosse fruto de determinação pessoal. É antes, deixar que a Palavra ecoe dentro de nós com a sua eficácia. Como os discípulos de Emaús, deixemos que a escuta da Palavra abra os nossos olhos e aqueça nosso coração; abra a nossa mente à compreensão das Escrituras e nos torne vigilantes aos movimentos do Espírito, para discernir a vinda do Senhor nos altos e baixos da vida, e responder com escolhas segundo o evangelho.

 

Amém. Axé. Awirê. Aleluia.

 

Emerson Sbardelotti

Doutor em Teologia pela PUC-SP.

Agente de Pastoral Leigo e Ministro da Palavra na Paróquia Nossa Senhora da Conceição Aparecida, Cobilândia, Vila Velha, Arquidiocese de Vitória do Espírito Santo.

Membro da Equipe de Formação do Centro Ecumênico de Estudos Bíblicos – Espírito Santo.

Membro da Executiva do Movimento Nacional Fé e Política – Espírito Santo.

Membro da Comissão de Formação do Conselho Nacional do Laicato do Brasil – Regional Leste 3 – Espírito Santo.

 

Imagem: Cerezo Barreda.



[1] Disponível em: < https://www.youtube.com/watch?v=WacRoaCk8h0>. Acesso em 09 fev. 2025.

[2] MESTERS, Carlos. OROFINO, Francisco. Formação e Espiritualidade do Ministro da Palavra. São Paulo: Editora Santuário, 2021.

[3] MESTERS, Carlos. Jesus Formando e Formador – Aprender e Ensinar. São Leopoldo: CEBI, 2012.

[4] PACHECO, Dilza. CARPANEDO, Penha. Leitura Orante. São Paulo: Apostolado Litúrgico, 2014.

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