Partilha da Palavra: São Pedro e São Paulo

29 de Junio de 2024

[Por: Emerson Sbardelotti]




SOLENIDADE – COR VERMELHA

30 DE JUNHO DE 2024

 

PRIMEIRA LEITURA

Leitura dos Atos dos Apóstolos 12,1-11

 

A Primeira Leitura de hoje narra a perseguição sofrida pelas primeiras comunidades cristãs: a decapitação de Tiago; a prisão de Pedro; contudo, tal perseguição não consegue impedir que a mensagem de Jesus de Nazaré se espalhe pelo mundo conhecido de então. Toda árvore que dá frutos bons, leva muita pedrada; assim é com a comunidade reunida ao redor de Pedro; uma comunidade que dá testemunho da fé em Jesus de Nazaré, que reza pelo irmão perseguido, pela irmã perseguida e recebe de Deus força para encarar os desafios e as ameaças de morte; é como diz o tema cinquentenário do Primeiro Intereclesial das CEBs em Vitória-ES (1975): Uma Igreja que nasce do povo pelo Espírito de Deus. Uma Igreja que nasce pela ação do Ressuscitado, que envia suas discípulas e seus discípulos em missão, envoltos da Ruah Divina.

 

A mensagem de fundo da Leitura é que devemos dar testemunho de Jesus de Nazaré nos momentos de calmaria, mas principalmente, nos momentos de tempestade. Somos convocados/as para a missão, e temos a certeza que a Igreja não se fecha em si mesma, ela está em saída, pois Jesus, caminha com a gente, e o Espírito Santo impulsiona a gente por caminhos desconhecidos. Superar nossos medos não é uma tarefa fácil, porém, é Deus que vai na nossa frente, embalando nossos sonhos e utopias, adubando nossas alegrias e esperanças, pois grandes são as perseguições.

 

Testemunhar a fé em Jesus de Nazaré é saber que em algum momento, sozinhos ou em comunidade; assim como Pedro, seremos presos por incomodarmos o sistema constituído, por não nos enquadrarmos na teologia do domínio, por sermos profetas em uma sociedade que persegue e mata os/as profetas. A atitude sempre será de prontidão: “Levanta-te depressa!”; “Coloca o cinto e calça tuas sandálias!”; “Põe tua capa e vem comigo!”. Nesta hora de nossa vida, honraremos a Deus cantando:

 

VAMOS PRA MISSÃO[1]

(Zé Vicente)

   

Nós vamos pra missão

Nós vamos trabalhar

É Deus quem nos convida

Para a vida transformar

 

Desperta minha irmã desperta meu irmão

Contempla a nossa gente abandonada

O pobre está clamando a terra esta gritando

Pois vem juntar-se a nós nesta jornada!

 

O sino já tocou o galo já cantou

O dia vem nascendo atrás dos montes

A marcha vai passando alegre eu vou cantando

Deus vivo é água viva em nossas fontes

 

Se alguém você feriu se alguém o machucou

Se tudo ao seu redor está escuro

Perdoa o seu irmão acolhe o seu perdão

O amor é o segredo do futuro

 

Você que escutou sorriu e se encantou

E firme está presente nessa estrada

Contigo eu vou contente Deus vai à nossa frente

Nós somos missionários da alvorada

 

SALMO RESPONSORIAL 33(34),2-3.4-5.6-7.8-9 (R. 5b)

 

Segundo José Bortolini[2]: “É um salmo de ação de graças individual. Uma pessoa passou por uma situação difícil, por temores e apertos, consultou a Javé, gritou e foi atendida. Javé respondeu e livrou, ouviu e salvou, e agora essa pessoa está no Templo de Jerusalém para agradecer. Há gente em torno dela, pois a ação de graças era feita em voz alta, em espaço aberto. Ela faz seu agradecimento público, de forma que muita gente toma conhecimento da graça alcançada. O salmo se torna, assim, catequese. [...] O salmo revela a superação de um conflito terrível. De fato, a expressão “consultei a Javé” se refere a um acontecimento concreto. As pessoas injustamente acusadas e, por isso, perseguidas se refugiavam no Templo de Jerusalém. Aí passavam a noite à espera de uma sentença. De manhã, um sacerdote tirava as sortes para ver se a pessoa acusada era inocente ou culpada. Foi o caso de quem criou este salmo. Passou a noite no Templo, confiante, e de manhã foi declarado inocente. Resolve, então, agradecer a Javé, mostrando, aos outros pobres que aí estão, as maravilhas que Deus fez por ele. O salmo informa sobre a situação econômica do salmista. É pobre: “Este pobre gritou, Javé ouviu, e o salvou de todos os apertos”. E pobres são também as pessoas que o rodeiam no Templo, no momento da ação de graças: “Eu me orgulho por causa de Javé: que os pobres ouçam e fiquem alegres”. Aliás, o salmista convida os empobrecidos a fazer sua profissão de fé: “Repitam comigo: Javé é grande! Juntos exaltemos o seu nome” (BORTOLINI, 2013, p. 144-146).

 

Para Carlos Mesters[3]: “A oração deste salmo é fruto de uma sabedoria acumulada e amadurecida pela experiência ao longo dos anos da vida. A sabedoria se expressa através da repetição constante do nome YHWH, repetido dezessete vezes só neste salmo. O salmista, após passar por uma experiência de libertação, convida os pobres a se unirem a ele numa oração agradecida. Na oração ele convida a comunidade a viver no temor de YHWH. Isso significa reconhecer nossa pequenez e nossos limites diante de Deus, demonstrando nossa vontade em realizar o projeto de justiça, construindo a paz e vencendo toda a maldade. Viver no temor de YHWH é lutar pela vida plena para todos” (MESTERS, OROFINO & WEILER, 2016, p. 118-119).

 

SEGUNDA LEITURA

Leitura da Segunda Carta de São Paulo a Timóteo 4,6-8.17-18

 

A Segunda Leitura de hoje apresenta-nos o apóstolo Paulo aprisionado, acorrentado, prestes a ser assassinado. Costuma-se chamar este trecho da Carta de “testamento de Paulo” onde ele faz uma revisão de sua vida, fazendo memória do que fez e do que poderá ser feito. Contudo, sua hora se aproxima e ele reconhece que combateu o bom combate, completou a corrida, guardou a fé. Paulo tem a profunda certeza que está reservada para ele a coroa da justiça, símbolo da imortalidade, da vitória, da alegria e recompensa que Deus concederá a ele e a todas as pessoas que esperam e lutam com amor para realizar o Projeto de Deus. Os gregos, nas olímpiadas, entregavam aos vencedores a coroa de louro, que representava a suprema glória para a alma grega. Na Roma Antiga era uma coroa triunfal concedida a um general vitorioso que cruzava os arcos da cidade. A mensagem central da leitura é que Deus sempre intervêm em nosso favor, em todos os momentos de nossas vidas, principalmente nas tribulações: abandono, cansaço, desesperança. Junto ao apóstolo Paulo, devemos sempre cantar:

 

QUEM SERÁ CONTRA NÓS?[4]

(Valmir Neves Silva)

 

Quem nos separará? Quem vai nos separar do amor de Cristo?

Quem nos separará?

Se Ele é por nós, quem será, quem será contra nós?

Quem vai nos separar do amor de Cristo?

Quem será? (Rm 8,31-39)

 

 

Nem a espada, ou perigo,

nem os erros do meu irmão,

nenhuma das criaturas,

nem a condenação.

 

Nem a vida, nem a morte,

a tristeza ou aflição.

Nem o passado, nem o presente,

o futuro, nem opressão.

 

Nem as alturas, nem os abismos,

nem tampouco a perseguição.

Nem a angústia, a dor ou a fome,

nem a tribulação.

 

EVANGELHO

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Mateus 16,13-19

 

O dia 29 de junho (uma celebração presente no calendário litúrgico da Igreja Católica Apostólica Romana), é a data consagrada pelo nosso povo - exclusivamente à memória de São Pedro. É claro que a tradição ocidental junta, numa única celebração, a memória de São Pedro e São Paulo, colunas da Igreja. Mas, para seguirmos a intuição do nosso povo, com a liberdade dos filhos e filhas de Deus, podemos consagrá-la especial e exclusivamente à memória do santo pescador e pecador, que aprendeu, às custas de muitas mancadas, o amor e a fidelidade a Jesus, seu Mestre. Podemos deixar para fazer com São Paulo, o que fazem os paulistas, comemorando a sua preciosa memória no dia 25 de janeiro ou no domingo seguinte.

 

O Papa Francisco[5] nos diz: “Os apóstolos Pedro e Paulo aparecem aos nossos olhos como testemunhas. Nunca se cansaram de anunciar, viver em missão, a caminho, desde a terra de Jesus até Roma. E aqui levaram o seu testemunho até ao fim, dando a vida como mártires. Se formos às raízes do seu testemunho, descobrimo-los testemunhas de vidatestemunhas de perdão e testemunhas de Jesus. Testemunhas de vida e, todavia, as suas vidas não foram límpidas nem lineares. Eram ambos de índole muito religiosa: Pedro, discípulo da primeira hora (cf. Jo 1, 41); Paulo, acérrimo defensor das tradições dos pais (cf. Gl 1, 14). Mas cometeram erros enormes: Pedro chegou a negar o Senhor; Paulo, a perseguir a Igreja de Deus. Ambos reentram em si por uma pergunta de Jesus: «Simão, filho de João, tu Me amas?» (Jo 21, 15); «Saulo, Saulo, porque Me persegues?» (At 9, 4). Pedro fica pesaroso com as perguntas de Jesus; Paulo, encandeado pelas suas palavras. Jesus chamou-os pelo seu nome e mudou a sua vida. E, depois de todas estas aventuras, fiou-Se deles, dois pecadores arrependidos. Poderíamos perguntar-nos: Porque é que o Senhor não nos deu duas testemunhas integérrimas, com a ficha limpa, com a vida ilibada? Porquê Pedro, quando havia João? Porquê Paulo e não Barnabé? Nisto, encerra-se uma grande lição: o ponto de partida da vida cristã não está no fato de ser dignos; com aqueles que se julgavam bons, bem pouco pôde fazer o Senhor. Quando nos consideramos melhores que os outros, é o princípio do fim. O Senhor não realiza prodígios com quem se crê justo, mas com quem sabe que é indigente. Não é atraído pela nossa habilidade, não é por isso que nos ama. Ele ama-nos como somos, e procura pessoas que não se bastam a si mesmas, mas estão prontas a abrir-Lhe o coração. Pedro e Paulo apresentaram-se assim transparentes diante de Deus. Pedro disse-o imediatamente a Jesus: «Sou um homem pecador» (Lc 5, 8). Paulo escreve que era «o menor dos apóstolos, nem [era] digno de ser chamado Apóstolo» (1 Cor 15, 9). E, na vida, mantiveram-se nesta humildade até ao fim: Pedro crucificado de cabeça para baixo, porque se julgava indigno de morrer como o seu Senhor; Paulo sempre afeiçoado ao seu nome, que significa «pequeno», esquecendo-se do que recebeu no nascimento, Saulo, nome do primeiro rei do seu povo. Compreenderam que a santidade não está no elevar-se mas em humilhar-se: não é uma subida na classificação, mas confiar dia a dia a própria pobreza ao Senhor, que realiza grandes coisas com os humildes. Qual foi o segredo que, no meio das fraquezas, os fez continuar para diante? O perdão do Senhor. Descubramo-los, pois, como testemunhas de perdão. Nas suas quedas, descobriram a força da misericórdia do Senhor, que os regenerou. No seu perdão, encontraram uma paz e alegria irreprimíveis. Com o mal que fizeram, poderiam viver com sentimentos de culpa: quantas vezes terá Pedro pensado na sua negação! Quantos escrúpulos para Paulo, que fizera mal a tantas pessoas inocentes! Humanamente, faliram; mas encontraram um amor maior do que os seus fracassos, um perdão tão forte que curava até os seus sentimentos de culpa. Só quando experimentamos o perdão de Deus é que renascemos verdadeiramente. Recomeça-se daqui: do perdão. Reencontramo-nos a nós mesmos aqui: na confissão dos nossos pecados. Testemunhas de vida, testemunhas de perdão, Pedro e Paulo são sobretudo testemunhas de Jesus. No Evangelho de hoje, Jesus pergunta: «Quem dizem os homens que é o Filho do Homem?». As respostas evocam personagens do passado: João Batista, Elias, Jeremias ou alguns dos profetas. Pessoas extraordinárias, mas todas mortas. Diversamente, Pedro responde: «Tu és o Cristo» (cf. Mt 16,13.14.16), isto é, o Messias. Uma palavra que não indica o passado, mas o futuro: o Messias é o esperado, a novidade, aquele que traz ao mundo a unção de Deus. Jesus não é o passado, mas o presente e o futuro. Não é um personagem distante para lembrar, mas alguém a quem Pedro trata por «tu»: Tu és o Cristo. Para a testemunha, mais do que um personagem da história, Jesus é a pessoa da vida: é o novo, não o já visto; a novidade do futuro, não uma lembrança do passado. Por isso, não é testemunha quem conhece a história de Jesus, mas quem vive uma história de amor com Jesus. Porque, no fundo, o que a testemunha anuncia é apenas isto: Jesus está vivo e é o segredo da vida. De facto, vemos que, depois de ter dito «Tu és o Cristo», Pedro acrescenta: «o Filho de Deus vivo» (16,16). O testemunho nasce do encontro com Jesus vivo. E, no centro da vida de Paulo, encontramos a mesma palavra que transborda do coração de Pedro: Cristo. Paulo repete esse nome continuamente: quase quatrocentas vezes nas suas cartas! Para ele, Cristo não é apenas o modelo, o exemplo, o ponto de referência: é a vida. Escreve: «Para mim, viver é Cristo» (Fp 1, 21). Jesus é o seu presente e o seu futuro, a ponto de, à vista da sublimidade do conhecimento de Cristo, considerar o passado como lixo (cf. Fp 3, 7-8)” (FRANCISCO, 2019, p. 1).

 

No Evangelho de hoje, Jesus de Nazaré envia os doze em missão e eles tomam conhecimento das reações do povo a respeito dele, considerando-o como enviado especialíssimo de Deus para preparar a era messiânica; alguém poupado da morte ou morto e redivivo para ter maior autoridade. As diversas respostas colocam Jesus de Nazaré na linha da tradição profética.

 

Messias-Cristo (O Ungido) era o título de esperança para indicar o salvador que Deus enviaria ao seu povo. Naquele momento da história de Israel a esperança em um Messias-Cristo não estava separada das aspirações políticas de um povo escravo de Roma. De fato, a missão de Jesus era anunciar o projeto de vida do reino de Deus. Sua nova comunidade-igreja de amigos, de discípulos missionários, terá em Pedro, sua pedra fundamental (do grego: pétros - indica uma pedra, pedregulho que se pode pegar, mover e lançar). Enquanto a pedra (do grego: petra - silhar, penha ou rocha, aquilo que provê um fundamento sólido para uma construção), é onde se assentará a obra e o domínio de Jesus que ele chama de "minha igreja". Ao mudar o nome de Simão para Pedro, atribui a ele a tarefa de ser a rocha que dará solidez à comunidade nova daqueles que aderem a Jesus pela fé. Isso não é um reconhecimento de suas qualidades pessoais e naturais, mas ao que Pedro será. É um caminho vocacional que irá transformar Pedro, para a missão que é unir a todos em torno da Palavra de Deus e de sua misericórdia. Não se trata de um poder sem limites, mas é um poder de responsabilidade pastoral.

 

No outro lado da História, temos o apóstolo Paulo, que é o grande responsável pela difusão do Evangelho. Transformado por Cristo em mensageiro, ele realiza com excelência a missão dos apóstolos serem testemunhas de Cristo. Ele é o apóstolo das nações. Ele teve seu nome mudado por Cristo, seduziu e se deixou seduzir, combateu o bom combate, completou a carreira, manteve a fé. Por causa de Paulo temos uma teologia jesuânica; para nós da América Latina e do Caribe, ela é da libertação, inculturada, próxima a nós.

 

O que seria hoje combater o bom combate? Lutar pela justiça, pela verdade, contra o racismo, contra o fundamentalismo, contra o fanatismo, contra a discriminação, contra o machismo e contra todos os tipos de violência que impede sermos de fato, seres humanos. Pedro e Paulo são personagens com características bem diferentes, porém, com um mesmo intuito: fazer com que a mensagem de Jesus de Nazaré chegue a todos os corações. Neste dia se comemora na Igreja Católica, o dia do Papa; que nossas orações sejam para o querido e amado Papa Francisco, no sentido que ele combata o bom combate, tenha força para pastorear suas ovelhas e continue sendo fiel à alegria do Evangelho, com seu testemunho de fé e vida, de levar a Igreja a se abrir cada dia mais, a ser uma Igreja em saída, samaritana, profética, como intuiu o Concílio Ecumênico Vaticano II, se fazendo Igreja dos pobres, seguindo os passos do Mestre de Nazaré.

 

Amém! Axé! Awirê! Aleluia!

 

ARTE-VIDA: Maximino Cerezo Barredo

 

Emerson Sbardelotti

Simplex agricola ego sum in regnum vitae



[1] Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=bUToRHoudCo>. Acesso em: 28 jun. 2024.

[2] BORTOLINI, José. Conhecer e Rezar os Salmos – comentário popular para nossos dias. 5.reimp. São Paulo: Paulus, 2013.

[3] MESTERS, Carlos. OROFINO, Francisco. WEILER, Lúcia. Rezar os Salmos hoje – a lei orante do povo de Deus. São Leopoldo: CEBI. São Paulo: Paulus, 2016.

[4] Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=TMusGEJ0tA8>. Acesso em: 28 jun. 2024.

[5] FRANCISCO. Homilia na Solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo. Basílica Vaticana: 19 jun. 2019. Disponível em: <https://www.vatican.va/content/francesco/pt/homilies/2019/documents/papa-francesco_20190629_omelia-pallio.html>. Acesso em: 28 jun. 2024.

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