Partilha da Palavra: 3º. Domingo da Páscoa

23 de Abril de 2023

[Por: Emerson Sbardelotti]




PRIMEIRA LEITURA

Leitura dos Atos dos Apóstolos 2,14.22-33

 

A leitura de hoje refere-se ao primeiro anúncio da fé, que Pedro, junto aos outros apóstolos, dirigem aos judeus e aos pagãos que se encontravam em Jerusalém, com a finalidade de que eles e elas se convertessem à novidade do Evangelho de Jesus de Nazaré. Este anúncio faz parte do discurso de Pedro no dia de Pentecostes.

 

Este anúncio chama-se Querigma; significa, primeiro anúncio, onde as pessoas são convidadas a aderirem à mensagem de Jesus de Nazaré; ou ainda proclamação de uma notícia por um arauto, é o essencial da fé proclamada aos não cristãos para tocar seus corações.

 

O querigma, nos dias atuais, implica no desafio de comunicar a própria experiência de fé, a experiência de fé da Comunidade Eclesial de Base, posicionando-se enquanto pessoas e comunidades de fé, nesta sociedade capitalista, racista, fundamentalista, preconceituosa que tem se afastado deste anúncio básico e do compromisso que ele traz: Deus faz justiça vencendo todas as formas de injustiça que geram a morte, que nós criamos; por isso, é nossa responsabilidade e missão, lutar contra todas as raízes da injustiça geradora da morte.

 

SALMO RESPONSORIAL 15 (16), 1-2a. 5.7-8.9-10.11 (R. 11ab)

 

 

O Salmo de hoje é uma oração pessoal de confiança, talvez por viver num ambiente hostil e passasse por necessidades. A pessoa ao cantar este Salmo renova e aprofunda sua vontade de entregar-se totalmente nas mãos de Deus e viver junto dele para sempre. 

 

Há três momentos importantes deste Salmo: 1. A introdução traz um pedido e um sinal de confiança. 2. Uma profissão de fé – rejeição a todos os outros deuses, ídolos e senhores do mundo. 3. A ideia de caminho. Deus é o companheiro de caminhada, que enche a todos nós de alegria, uma alegria que não termina. Não sabemos a época em que este Salmo surgiu de fato, porém, é evidente o contexto: um tempo de total idolatria e o conflito com os seguidores de Deus. Mas Deus está próximo, deposita sua alegria e sua confiança naqueles/as que creem nele.

 

Alegria e confiança são duas palavras que marcam este Salmo, pois há uma intimidade imensa entre o/a salmista e o próprio Deus.

 

No final, a certeza que alegres nos encontraremos frente a frente com o Deus da Vida! Deus é mais forte do que a morte!

 

O Ofício Divino das Comunidades[1] traz uma versão popular[2] do Salmo de hoje, que ajuda-nos a rezar e a refletir melhor:

 

1. Protege-me, ó Deus, tu és meu abrigo;

“Só tu és meu bem”, eu digo ao Senhor.

Rejeito esses deuses que o mundo promove;

Aos grandes não sirvo, nem presto favor.

 

2. Aqui, nesta terra, és, Deus, minha herança.

Em ti meu destino, porção garantida:

Tiraram a sorte pra ver minha parte,

Tu és a mais bela herança da vida.

 

3. Bendito o Senhor que é meu conselheiro,

À noite me alerta o meu coração.

Pra sempre o Senhor perante os meus olhos,

Com ele meus passos não vacilarão.

 

4. O meu coração se alegra contente,

Até minha carne repousa segura.

No mundo dos mortos tu não me abandonas.

Nem deixas teu servo preso à sepultura.

 

5. Tu me ensinarás da vida o caminho,

Em tua presença há muita alegria.

O Deus do universo, qual Mãe me mostrou,

Cantemos louvores de noite e dia.

 

SEGUNDA LEITURA

Leitura da Primeira Carta de São Pedro 1,17-21

 

Segundo José Bortolini[3]: “Numa sociedade marcadamente dividida entre ricos e pobres, patrões e escravos, nativos e estrangeiros, onde os primeiros abusam dos segundos, a mensagem cristã anuncia fortemente: diante de Deus todos são iguais! Tal é a força nova e revolucionária da semente lançada por Jesus. Os cristãos, por sua vez, devem “viver no temor de Deus”, ou seja, procurar ser coerentes ao máximo com o projeto de Deus no mundo hostil em que vivem. A razão da constância dos cristãos está na ação de Jesus em favor deles. Jesus deu o sangue para realizar esse projeto. Não pagou com prata ou ouro a vida da nova sociedade. A ação de Jesus se opõe à dos ricos e patrões que compram vidas humanas para seu serviço. Jesus deu a vida, o sangue, para libertar as pessoas, de modo que todos possam gozar dos bens do projeto de Deus: liberdade e vida em plenitude. Esse projeto de Deus se concretizou em Jesus, “manifestado nos últimos tempos por causa de vocês”. Os cristãos dispersos, pobres e perseguidos têm em si o poder de Deus, porque Jesus se tornou pobre, escravo, solidário com os que sofrem, para criar com eles e a partir deles a humanidade nova”.

 

EVANGELHO

Proclamação do Evangelho de Jesus Cristo segundo Lucas 24,13-35

 

O Evangelho de hoje é a maravilhosa narrativa dos discípulos de Emaús. O texto é uma narrativa pedagógica da fé em Jesus de Nazaré ressuscitado. Segundo A. George[4]: “Leva os discípulos a ultrapassarem o escândalo da cruz com o auxílio das Escrituras, quer dizer, leva-os ao entendimento da lei da salvação pela provação. Ensina aos membros da Igreja que, em todos os tempos, podem encontrar seu Mestre ressuscitado nas Escrituras e na fração do pão”.

 

O Evangelho que lemos e ouvimos hoje é um texto exclusivo de Lucas. É um dos textos mais profundos para a nossa fé no Ressuscitado. FICA CONOSCO SENHOR, é o pedido que todos nós, todas nós fazemos. 

 

Segundo Renato Küntzer[5]: “O texto relata a experiência de um casal de discípulos que atende ao chamado radical e integral de seguimento (cf. Lc 9.23-27). Mais do que fiéis de uma determinada igreja ou movimento religioso cristão, é preciso que haja discípulos, seguidores de Jesus Cristo e testemunhas de sua boa-nova. O texto diz que Jesus participa da caminhada. Ele vê a situação das comunidades, assim como viu a situação dos dois discípulos. Ele também ouve a sua forma de ver as coisas que aconteceram. O texto ressalta tanto o cotidiano da comunidade (caminhada, ensino das Escrituras, o partir do pão), que a aparição acaba tendo um aspecto secundário. Importante é considerar que, mesmo em tempo de cegueira, quando a comunidade não é capaz de associar a causa de Jesus com a realidade de vida, Ele caminha junto. Jesus vê. Jesus vê bem a tristeza, a decepção e o desânimo de suas comunidades. Jesus ouve os seus lamentos, as suas falsas esperanças e a sua total perda de esperança em relação ao futuro. E infelizmente já não caminhamos. A maioria está numa correria louca. Uns para sobreviver institucionalmente e manter a sua boa tradição e costumes como prestadores de serviços religiosos. Outros para poder continuar competindo num mercado religioso cada vez mais aguçado e sedutor, vendendo o produto da salvação individual sem qualquer compromisso comunitário e coletivo. Nisso está visível a cegueira. O texto assegura que Jesus está presente no ensino das Escrituras e do evangelho da vida. Jesus conhece a lentidão para entender e a demora em acreditar em tudo o que as Escrituras falaram. Por isso intervém para ensinar as Escrituras. Está presente nos gestos que recuperam a memória nele e ajudam a dar um novo sentido à vida da comunidade a partir da leitura e do ensino das Escrituras. E quanta diversidade de leituras existe! Diferentes chaves de interpretação afastam e separam pessoas, fazem diferentes grupos e movimentos cristãos se odiarem. Provocam a formação de grupos fechados e chegam ao cúmulo da segregação do diferente. Quanto coração há que se esquenta por pouco ou por nada! Há corações superaquecidos por interesses pessoais. A cegueira em relação à causa de Jesus está cada vez mais evidente. Finalmente, o texto lembra-nos que Jesus partilha o pão. Não só palavras. Não só reflexões. É necessário algo mais. Mais palpável. O importante é partir o pão. A partilha é decisiva e essencial. Esse gesto de Jesus a comunidade é desafiada a repetir sempre. As outras coisas (caminhada, ensino) fazem no máximo o coração arder, mas a partilha faz ver. A partilha como gesto cheio de sentido e de exigências. Sem dúvida, a comunidade necessita da leitura das Escrituras, de sua interpretação e mensagem atual (evangelização). Com certeza, a comunidade, a partir dessa evangelização, experimenta a comunhão. E é a partir dessas duas experiências em Cristo que a comunidade vai abrir seus olhos à experiência da partilha. Vai conseguir olhar para além de si própria, de suas preocupações, para dentro do mundo e da sociedade. Ela se torna diaconal. Ela vai ao encontro de seu serviço. Se antes caminhava lentamente e sem perspectiva de futuro, agora ela volta com vigor e animada para a sua tarefa (Lc 9.23-27). A presença do Jesus ressuscitado ao redor daquela mesa com Cléopas e sua esposa Maria foi uma experiência tão forte e marcante, que não era mais possível negá-la, voltar atrás. Cabia a eles continuarem o que Jesus havia iniciado. O caminho que havia sido animado pela palavra concretizara-se pela experiência da partilha do pão. Exercitamos essa experiência do partir do pão em comunidade na Santa Ceia. Mas que não seja uma vivência restrita a um momento litúrgico e celebrativo do culto cristão, mas sim uma conduta da comunidade para dentro da realidade que a cerca”.

 

Jesus de Nazaré desapareceu após repartir o pão, muitas pessoas, até hoje, ficam pensando para onde teria ido. O único lugar possível para onde Jesus foi: para dentro do coração dos/as discípulos/as!

 

Jesus de Nazaré é aquele que caminha com a humanidade; é aquele que revela à comunidade o sentido de sua morte e a vitória da ressurreição; é aquele que partilha e comunica a vida! Nós, como discípulos, discípulas, missionários, missionárias, precisamos testemunhar todos os dias de nossas vidas a ressurreição de Jesus de Nazaré, assim, estaremos prolongando a vitória do Mestre sobre a morte. Assim, Ele estará para sempre dentro de cada um, cada uma de nós!

 

Há um canto de comunhão no Hinário Litúrgico da CNBB[6] que explica a passagem de hoje:

 

OS DISCÍPULOS DE EMAÚS

(Pe. João Carlos Ribeiro)

 

Andavam pensando, tão tristes, de Jerusalém a Emaús

Os dois seguidores de Cristo, logo após o episódio da cruz

Enquanto assim vão conversando, Jesus se achegou devagar

De que vocês vão palestrando e ao Senhor não puderam enxergar.

 

Fica conosco Senhor, é tarde e a noite já vem

Fica conosco Senhor, somos teus seguidores também.

 

Não sabeis então forasteiro, aquilo que aconteceu

Foi preso Jesus Nazareno, Redentor que esperou Israel

Os chefes a morte tramaram, do Santo Profeta de Deus

O justo foi crucificado, a esperança do povo morreu.

 

Três dias enfim se passaram, foi tudo uma doce ilusão

Um susto as mulheres pregaram, não encontraram seu corpo mais não

Disseram que ele está vivo, que disso souberam em visão

Estava o sepulcro vazio, mas, do Mestre ninguém sabe não.

 

Jesus foi então relembrando, pro Cristo na glória entrar

Profetas já tinham falado, sofrimentos devia enfrentar

E pelo caminho afora, ardia-lhes o coração

Falava-lhes das Escrituras, explicando a sua missão.

 

Chegando, afinal, ao destino; Jesus fez que ia passar

Mas eles demais insistiram: vem, Senhor, vem conosco ficar

Sentado com eles à mesa, deu graças e o pão repartiu

Dos dois foi tão grande a surpresa: Jesus Cristo, o Senhor ressurgiu.

 

FICA CONOSCO SENHOR!

 

Amém! Axé! Awirê! Aleluia!

 

ARTE-VIDA: Maximino Cerezo Barredo / Luís Henrique Alves Pinto

 

Emerson Sbardelotti

Simplex agricola ego sum in regnum vitae.

 

 

[1] OFÍCIO DIVINO DAS COMUNIDADES. 3.ed. São Paulo: Paulus, 2018, p. 34-35.

[2] Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=MEGYB1sQBP8>. Acesso em: 21 abr. 2023.

[3] BORTOLINI, José. Roteiros Homiléticos – Anos A. B. C, Festas e Solenidades. 5.ed. São Paulo: Paulus, 2010, p. 102.

[4] GEORGE, A. Leitura do Evangelho segundo Lucas. 4.ed. São Paulo: Paulus, 1982, p. 50.

[5] Disponível em: <https://cebi.org.br/reflexao-do-evangelho/reflexao-do-evangelho-os-discipulos-no-caminho-de-emaus/>. Acesso em: 21 abr. 2023.

[6] Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=SYi_OsdDZCk&list=PLbdNOrAd28quHVXE-5atdACVv_T4WtNNB&index=8>. Acesso em: 21 abr. 2023.

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