Sínodo sobre a sinodalidade: um primeiro olhar

01 de Noviembre de 2021

[Por: Luis Henrique Marques | Agencia SIGNIS Brasil]




Nossa reportagem ouviu Óscar Elizalde Prada, jornalista e professor colombiano que participa da Comissão de Comunicação dessa nova iniciativa do papa Francisco que visa uma Igreja mais sinodal.

 

Para muitos especialistas, a sinodalidade não é uma novidade, mas um dos elementos constitutivos da própria identidade da Igreja. Na prática talvez, a teoria ainda seja outra. Por essa razão, isto é, para aprofundar a experiência de uma Igreja mais sinodal (e, portanto, em que haja mais participação e comunhão do Povo de Deus, de forma a ser mais fiel à sua missão), o papa Francisco acaba de dar início aos trabalhos de um novo sínodo, dessa vez sobre a própria sinodalidade. Para entender melhor essa iniciativa, como está sendo organizada, quais as primeiras impressões e expectativas, entrevistamos o jornalista e professor colombiano Oscar Elizalde Prada, membro da Comissão de Comunicação do Sínodo sobre a Sinodalidade.

 

Oscar Elizalde Prada tem 44 anos e é um leigo colombiano, comunicador e doutor em Comunicação Social. Fez sua trajetória no jornalismo por meio da revista semanal Vida Nueva, da Colômbia, além de atuar no âmbito de assessoria de comunicação, sobretudo para a Confederação Latino-Americana dos Religiosos (CLAR) e Confederação Interamericana de Educação Católica (CIEC) e, mais recentemente, para o Centro de Comunicação da Conferência Episcopal Latino-americana (CELAM). Há mais de 10 anos trabalha como professor e pesquisador na Universidade de La Salle, de Bogotá, onde desde 2008 atua também como diretor de comunicação e marketing.

 

Vamos à entrevista:

 

O que o levou à Roma para participar do Sínodo sobre Sinodalidade? Qual papel ou função assumiu nesse encontro?

 

Fui convidado a participar de uma das quatro comissões que foram constituídas para o sínodo, a de Comunicação. Além dessa, existem as comissões Teológica, Metodológica e de Espiritualidade. No total, 63 pessoas foram convocadas de todas as partes do mundo para participar dessas quatro comissões. Desse grupo, 8 são latino-americanos. Eu sou o único colombiano que participa desse grande grupo e o único latino-americano a fazer parte dessa Comissão de Comunicação, que é formada por 12 pessoas, das quais 2 de língua espanhola e 2 de língua portuguesa. Penso que fui convidado por conta da ideia da equipe geral do sínodo de integrar múltiplas vozes e representações de experiências nas diferentes áreas. Nesse sentido, a experiência de comunicação da Igreja na América Latina lhes parece bem interessante por considerarem, tendo em vista a contribuição que podemos oferecer.

 

O que você pode nos dizer sobre a temática central desse sínodo? Qual é o grande objetivo da Igreja e, especialmente do papa Francisco, ao abordar esse tema?

 

Eu penso que a frase que apresenta o tema desse sínodo – “Por uma Igreja mais sinodal: comunhão, participação e missão” – resume a intencionalidade do papa Francisco. Isso foi o que ele quis acentuar nas várias oportunidades em que se referiu a essa iniciativa. Antes da abertura em Roma, nos dias 9 e 10 de outubro, o papa teve um encontro com os fiéis da Diocese de Roma, quando ele enfatizou a razão pela qual ele vê esse sínodo segundo a necessidade de uma participação ampla da Igreja. Já não se trata somente de uma consulta para os bispos ou para um grupo específico como foi o Sínodo para Amazônia, quando consultou as bases da Região Pan-amazônica. Nessa oportunidade, o papa quer que todos os batizados sejamos envolvidos, porque todos somos protagonistas. Ninguém deve ficar de fora, disse o papa. Acho que o logo que simboliza o sínodo pretende mostrar essa dimensão de povo a caminho, em que as crianças, os mais velhos, os jovens, o clero, as e os religiosos, os bispos, todos são Povo de Deus. Creio que, quando o papa convocou a Assembleia Eclesial da América-latina e Caribe, ele expressou que não queria uma reunião que fosse de elite, mas sim que quer abrir a Igreja. Por isso, creio que, em última instância, esse sínodo vai ser fundamental para reforçar todo o processo de reforma da Igreja que o papa Francisco vem gerando, possibilitando uma maior participação, dando voz aos fiéis em gral e fazendo um esforço grande de escuta.

 

Você poderia explicar como é a dinâmica e a programação de trabalho do sínodo?

 

A dinâmica é progressiva conforme foi proposto pelo documento de preparação para o momento e pelo vade mecum. Esse último ajuda a explicar como podemos participar, sobretudo nessa primeira etapa do sínodo. Porém, o sínodo conta com um primeiro momento em que convida as igrejas locais a participar – o que acredito que é muito interessante e marcante – porque quer começar pelas bases, isto é, paróquias e dioceses. Todas as dioceses foram convidadas a iniciar esse processo de escuta a partir de 17 de outubro, o que deve se prolongar por seis meses, até o início do próximo ano. Então, virá uma fase continental, que vai também envolver aquelas quatro comissões. Porém, o papa quer que todo o processo volte em um momento para as bases, que essas não se limitem apenas à participação no início. Ele quer que todo o processo do sínodo esteja marcado por essas diferentes participações. É um sínodo de dois anos. Teremos esse período para viver momentos diferentes: momentos da igreja local, momentos da igreja continental. Finalmente, se quer chegar a constituir um instrumento de trabalho que reflita todo esse processo de discernimento, o que creio o papa resumiu nas três formas verbais com as quais apresentou a dinâmica do sínodo na celebração eucarística de abertura do processo sinodal: a primeira é nos encontrarmos; a segunda é nos escutarmos e a terceira, discernirmos juntos. Seguramente, aí existem muitos elementos que ainda vamos conhecer e aprofundar em termos metodológicos. Porém, no primeiro momento, esses são como que etapas marcantes a serem desenvolvidas durante o sínodo.

 

Qual a sua avaliação a respeito do que foi tratado em Roma? Considerando o que ouviu ali, você percebe dificuldades, controvérsias ou mesmo resistências ao se tratar o tema da sinodalidade na Igreja? Por outro lado, já identifica avanços a esse respeito?

 

O caminho que está sendo traçado - o “caminhar juntos” que quer dizer a palavra “sínodo” - creio que vivenciamos já na reunião de abertura que tivemos com o Santo Padre, no sábado, 9 de outubro (com a celebração eucarística) e no dia 10. Nos dias 11 e 12 se reuniram todas as quatro comissões para começarem juntas esse trabalho. Vejo com muito valor o fato de que a sinodalidade tenha começado com uma prática a já nessas mesmas comissões, a partir do momento em que passamos a nos conhecer e intercambiar experiências. Por exemplo: foram apresentadas várias experiências de sinodalidade de diferentes partes do mundo, como fez a Igreja na Austrália e a experiência que se viveu com o Sínodo dos Jovens. Também o padre argentino Carlos Galli, que é o coordenador da equipe teológico pastoral do CELAM, apresentou a experiência de sinodalidade da Assembleia Eclesial da América Latina e Caribe. Então, foi uma oportunidade para, em primeiro lugar, saber que experiências temos neste momento na Igreja e o que podemos aprender com o que estamos fazendo. Em segundo lugar, estamos tratando de definir os grandes desafios que temos para que o processo sinodal envolva a todos. É certo que há igrejas que talvez prefiram não falar de sinodalidade, prefiram que coisas continuem como estão, porque a sinodalidade muda um paradigma de participação na Igreja que a faz muito mais horizontal do que vertical. Trata-se de menos hierarquia e mais eclesialidade. As Igrejas da América Latina e Caribe terão uma grande oportunidade de contribuir e, de fato, têm muito o que contribuir, não somente pela experiência recente, mas pela caminhada que temos desde o Concílio Vaticano II. Além disso, temos muita paixão, porque cremos profundamente que esse é um caminho que necessitamos percorrer na Igreja. Eu recordei Aparecida nesses últimos dias, quando dizia que a Igreja necessita de uma forte comoção. Sinto que temos nessa oportunidade: a Igreja se sente chamada e desafiada a assumir o risco de fazer o caminho sinodal sem saber ainda onde isso vai levá-la. Vamos dar início a esse processo ao longo desses dois anos, porém, neste momento isso é muito incipiente. Por essa razão, encontramos respostas de diferentes ritmos a essa experiência. Aquilo que percebo na América Latina é que existem igrejas muito entusiasmadas. Os chilenos, por exemplo, criaram um hino para animar o sínodo; a Igreja na Costa Rica e na Colômbia criaram sites para iniciar esses trabalhos; há muito entusiasmo! Porém, há outras igrejas – temos que reconhecer – em que, no início, se predominou mais o silêncio. Não sabemos se por temor ou por desconhecimento; para alguns parece ser muito estranho que estejamos fazendo um sínodo sobre sinodalidade.

 

Como você avalia a contribuição das e dos leigos para a reflexão e desenvolvimento da sinodalidade na Igreja de hoje?

 

Nós como leigos, muitas vezes sentimos que não temos espaços suficientes para participar. Esse sínodo talvez possa nos permitir reivindicar um maior espaço dos leigos na Igreja. Creio que esse sínodo é uma oportunidade de ouro que não podemos deixar de aproveitar, porque todos nós leigos podemos nos aproximar de nossas paróquias e nossas dioceses e contribuir com o nosso olhar, nossa voz e nossa reflexão. Eu sinto que o papa Francisco deposita uma confiança cada vez maior nos leigos, quando, por exemplo, toma muitas decisões como dar a liderança às mulheres na Igreja e na Cúria Romana ou quando nomeia uma religiosa como subsecretária do sínodo, por exemplo. Há uma confiança de que os leigos têm muito mais a contribuir, não somente como auxiliares, como quem dá um apoio na liturgia ou numa celebração. Isso segue sendo muito importante, porém é importante também considerar os leigos a partir de suas profissões, do seu amor pela Igreja, da nossa inserção no mundo, onde são chamados a estar. Sinto que somos neste momento para a Igreja como um sangue novo que pode ajudá-la a se renovar. De fato, creio que essa é a melhor notícia desse sínodo que é como um empoderamento para que nós leigos participemos em pé de igualdade com os sacerdotes e religiosos, todos numa mesma situação de oportunidade. Estou sinceramente muito otimista com essa oportunidade!

 

Você vai participar da Assembleia Eclesial Latino-americana no México? Essa experiência poderá servir como uma referência importante para a construção de uma Igreja mais sinodal ao redor do mundo?

 

Sim, estou participando como membro e coordenador da Comissão de Comunicação da Assembleia. Por isso, estou seguindo para o México neste momento, porque estamos tratando de alguns temas referentes a essa assembleia. Tenho uma expectativa muito grande com o que a América Latina pode contribuir com esse sínodo a partir da experiência que fizemos. Se paramos para pensar, o papa nos convidou a refletir sobre a necessidade de nos encontrarmos, de nos escutarmos e de discernir. Creio que são três elementos que já estamos vivendo na Assembleia Eclesial. Essa assembleia teve uma fase de escuta muito importante, em que recorreu a diferentes vozes. Temos um documento que se refere às narrativas tais quais como foram feitas, sem filtros, sem interpretações e, neste momento, está sendo construído um documento de discernimento para a assembleia. Então, creio que a grande contribuição da América Latina é que não temos somente clara a teoria, mas estamos realizando uma prática que pode ser iluminadora para esse sínodo, como foi também a experiência do Sínodo da Pan-Amazônia, outra contribuição que pode ser muito importante para esse sínodo. Então, ao final da Assembleia Eclesial se espera que se proponham novos caminhos para a Igreja na América Latina. Creio que esses caminhos poderiam ser perfeitamente uma contribuição para a consulta e processo do sínodo que acabamos de iniciar.

 

Publicado em: https://www.agenciasignis.org.br/noticias/entrevista/2021/10/sinodo-sobre-a-sinodalidade-um-primeiro-olhar 

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