O futuro da educação sob a égide do ódio

17 de Abril de 2021

[Por: José Neivaldo de Souza]




Vivemos tempos difíceis! Hans Küng, teólogo alemão, dizia que a crise possibilita encontros, novas oportunidades e reinvenção da vida. Queira Deus! No Brasil, deparamos com a crise das narrativas. Nela, valores fundamentais da vida são adaptados, com a ajuda das mídias, à linguagem orquestrada das Fake News. Nunca a verdade foi tão destituída. Cabe citar a famosa frase do cineasta alemão Bertolt Brecht: “Que tempos são estes em que temos que defender o óbvio?” Realidade em crise lugar propício para o cultivo do ódio e da cegueira política e religiosa. Qual o futuro da educação? Que tipo de educação é favorável àqueles que plantam a cultura da morte? 

 

É de conhecimento que no Palácio do Planalto, numa sala vizinha à do presidente da república, Jair Bolsonaro, foi instalado o “gabinete do ódio”. Não vou me ater a explicações. Mais detalhes sobre podem ser encontrados na CPMI das Fake News e em alguns dos maiores jornais do país. Tal “gabinete” acolhe alguns servidores, ligados ao vereador Carlos Bolsonaro, responsáveis pelas mídias da presidência. Eles emitem diariamente falsos relatórios sobre o Brasil que, geralmente, são carregados de incentivo ao ódio popular e à cegueira política. 

 

A educação pelo ódio se diferencia pela não consideração do outro. Assim, a liberdade e a felicidade do outro devem ser interpretadas segundo os interesses de uma elite preocupada em manter o Status Quo vigente. 

 

O ódio, assim como o amor, é uma paixão, mas ao contrário do amor, ele se nutre daquilo que emperra a solidariedade e a justiça. O escritor russo, Anton Tchekhov, observara que entre todas paixões, o ódio é o que tem mais poder de unir. De fato, me vem à memória o julgamento e morte de Jesus Cristo. O ódio uniu Pilatos e Herodes. Eles, que antes eram inimigos, se uniram (Lc 23, 12). Rubem Alves escreve acerca da força do ódio e observa que ele “produz casamentos duradouros. O ódio não suporta a ideia de ver o outro voando livre, para longe... O ódio segura, para que o outro não seja feliz. O ódio gruda mais que amor”. Aqueles que se encontram no mesmo espírito, formam uma potestade e nada enxergam a não ser a si próprios. 

 

A tarefa do ódio é envenenar os olhos para que o outro não veja. Mencionando o poeta inglês, Willian Blake, Rubem Alves observa que ódio leva o tolo a não enxergar a beleza: “uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só o lixo”.  Mahatma Gandhi dizia que o “mundo está farto de ódio”, mas, nem por isso devemos combatê-lo com as mesmas armas, é indignar-se e fortalecer as relações baseadas no amor e na não-violência ativa. 

 

A educação tem a tarefa de ensinar a ver, observou Nietzsche. Como seria a educação sob a égide do ódio e da cegueira? Rubem Alves ajuda a dar uma resposta ao tratar da educação escolar como gaiola: “Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros desaprendam a arte do voo. Pássaros engaiolados são pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode levá-los para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a essência dos pássaros é o voo”. 

 

Mas... Há a escola que ensina a voar. Cecilia Meireles, como educadora, sabia disso: Quem consegue ver percebe que tudo ao nosso redor é vivo, ainda que não se comunique com voz humana. Voar é poder ver, ouvir e aprender esta linguagem da natureza, própria do mistério. Há olhares que encantam e são verdadeiros convites ao voo. Sob estes olhares a educação cria oportunidades para o amor. Sob estes olhares, educar é encorajar, soltar “porque o voo já nasce dentro dos pássaros. O voo não pode ser ensinado. Só pode ser encorajado”, dizia Rubem Alves. 

 

Para concluir, a educação, conduzida à gaiola, não liberta, não conhece a verdade e tampouco a justiça. Cecilia Meireles e Mário Quintana reagiram poeticamente àqueles que fazem da educação e da escola um instrumento de dominação e hoje, mais que nunca, podemos resgatá-los como críticos deste governo que insiste em cultivar ou educar através do ódio e da cegueira. Cecilia denunciou: “Toda vez que um justo grita, um carrasco vem calar. Quem não presta fica vivo, quem é bom, mandam matar”. Quintana ironizou ao reagir a este tipo de ideologia escolar: devemos levar a vida, como se estivéssemos gazeando aula. A escola, sob este tipo de comando, torna-se gaiola, lugar onde o aluno aprende a obedecer o seu dono e a odiar os seus iguais.

 

Imagem: http://padresycolegios.com/yorespeto-jovenes-ante-los-discursos-de-odio-en-la-red/   

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