Saudade de Deus

30 de Enero de 2020

[Por: José Neivaldo de Souza]




Deus me perdoe o desafeto! O que escrevo é parto de minh’alma. Ando desanimado! Não é depressão, sim indignação. Sabemos do que o ser humano é capaz e, não adianta, atrocidades foram cometidas em nome de Deus e nada parece ter mudado. As notícias me chegam e me dizem que é preciso duvidar de tudo. Tenho que confessar: ando duvidando de Deus. Qual Deus?

 

O deus, que se dá ao vexame de ser usado por pessoas como o presidente e outros, ligados a ele, cujos interesses violam a justiça social, o direito dos pobres e o cuidado com a biodiversidade; submisso a uma liderança, sem escrúpulos, que em vez de se preocupar com o mandato, para o qual foi eleito, se dedica a viajar pelo Brasil com o objetivo de conseguir votos suficientes para a homologação de seu partido junto ao TSE. Afinal, é preciso correr para concorrer à presidência da república em 2022. Vivemos hoje os dias de Hamlet: “Há algo de podre no reino da Dinamarca”.  

 

O deus que, na boca de pastores vorazes e sem temor, circula pelos púlpitos convencendo a comunidade a reconhecer firma em cartórios montados na porta das igrejas, sob uma bandeira cravada de projéteis: “aliança pelo Brasil”. Qual Brasil? O Brasil de uma elite gananciosa e desprovida de compaixão. É desanimador ver lideranças eclesiásticas adotando um discurso político sob a máscara religiosa: um discurso misógino, preconceituoso e beligerante tal como o daquele que os manipula e que, diante do monumento de Gandhi, teve a pachorra de menosprezar a paz. 

 

O deus usado e abusado por crentes amantes do dinheiro e conhecedores do diabo onde as palavras de Jesus não ecoam: "Ninguém pode servir a dois senhores; pois odiará a um e amará o outro, ou se dedicará a um e desprezará o outro. Vocês não podem servir a Deus e ao Dinheiro" (Mt 6,24). Ando desanimado com as igrejas. Ignoram o Deus verdadeiro que, na história de Israel, ensinou que a liberdade de uma nação não é submissão e escravidão à outra; ignoram o Deus que denunciou os desgovernos, as falcatruas do poder, as injustiças e a falta de caráter dos seus líderes.  

 

Tenho saudade de Deus! O Deus que não se submete aos interesses de nenhum ídolo, herói ou mito. Os meus anos de teologia me ensinaram a buscá-lo na causa da justiça, em favor dos oprimidos, preocupado com a natureza e no cuidado com aqueles que mais necessitam de amparo e proteção. “minh’alma tem sede de Deus” (Sl 42,2). Tenho saudade de Deus! Daquele que se deixa buscar com a ajuda do pensamento, em debate com a ciência e em diálogo com a cultura.  Ando desanimado! Que o Espírito do Deus verdadeiro me anime na resistência e na esperança. 

 

 

Imagem: https://comoumfarolquebrilha.com/2014/05/30/saudade-de-deus/ 

 

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