O papel profético da Igreja e a promoção humana integral

01 de Noviembre de 2019

[Por: Emerson Sbardelotti]




Vivemos dias de atualização, prática e refundação do Concílio Ecumênico Vaticano II ao retomarmos a profecia na vida cotidiana da Igreja. De toda a Igreja. Os novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral devem passar pelo viés da profecia. E a Amazônia, a Pan-Amazônia tem muito a ensinar ao mundo neste quesito. E seguem ensinando com o testemunho de seus mártires, de suas mártires. 

 

É preciso colocar em prática o pedido sempre atual de Dom Helder Camara: “Não deixe cair a profecia!”

 

Para Dom Pedro Casaldáliga “profeta é aquele que grita com os olhos!”.

 

Não dá mais para a Igreja falar de pobres e de pobreza mas esquecer do povo crucificado. Não dá mais para adjetivar a Opção pelos Pobres, diminuindo o seu alcance evangélico, e com isso não defender os pobres. Não dá para abrir mão de nossos/as mártires.

 

Ignácio Ellacuría, mártir de El Salvador nos diz que “por povo crucificado entende-se aquela coletividade que, sendo a maioria da humanidade, deve sua situação de crucifixão a uma ordem social promovida e sustentada por uma minoria que exerce seu domínio em função de um conjunto de fatores, os quais, como conjunto e dada sua concreta efetividade histórica, devem ser considerados pecado”.

 

Uma Igreja profética não deve cometer jamais os pecados sociais da indiferença e da omissão. Podemos errar enquanto Igreja de várias maneiras pois somos humanos, nunca por sermos omissos e indiferentes à dor dos povos. É preciso lembrar sempre que quem defende a vida por causa do seguimento à Jesus de Nazaré está sendo assassinado/a, e o número só aumenta. A Igreja precisa retomar o seu lugar e voltar a denunciar tais crimes, pois gritam os pobres, grita a Terra!

 

São os/as mártires do século XXI: seus altares são o chão onde pisaram, onde atuaram, onde adubaram com o próprio sangue por causa da defesa dos pequeninos, dos mais fracos, dos sem voz e sem vez, por causa da ecologia integral. Eles e elas acariciaram a carne crucificada de Cristo naqueles/as que defenderam. Como bem nos lembra o Papa Francisco: “Quem acaricia os pobres, toca a carne de Cristo!”

 

Para uma Igreja ser de fato profética, ela deve ameaçar o poder instituído, que só visa o lucro e não a vida em abundância para todos/as; ela deve denunciar as mazelas e violências cometidas por pessoas que se dizem cristãs; que usam a Igreja em benefício próprio; que levam o Povo Santo de Deus a se dividir por conta das fake news e a pecar; ela deve anunciar o Reino de Deus a partir dos Evangelhos, a partir do aggiornamento proposto por São João XXIII, a partir das intuições do Concílio Ecumênico Vaticano II; assim teremos uma Igreja samaritana, missionária, para-com-dos Pobres.

 

A Igreja deve ser a advogada e a protetora de todos/as que defendem a Vida e assumem todas as consequências por isso, inclusive a morte! Neste ponto, lembro-me de uma frase dita pelo mártir Gabriel Maire, em 1989, poucos dias antes de ser assassinado e que nos recorda o que é ser uma Igreja comprometida com o povo: “Prefiro morrer pela vida, do que viver pela morte!”.

 

Um novo Pacto das Catacumbas pela Casa Comum foi escrito ao final do Sínodo, nas Catacumbas de Santa Domitila, em Roma, no último dia 20 de outubro de 2019. Penso que este Pacto possa mostrar que a nova mulher e o novo homem devem favorecer a nova consciência ecológica. Não haverá saída para nós, para a natureza, para a Terra, se não mudarmos nossas atitudes e hábitos. É urgente defendermos o Planeta Terra e todos os seres vivos. Não haverá uma nova Arca de Noé. A mudança tem que começar agora! Ou salvamos todos/as, ou pereceremos todos/as.

 

Chegou o tempo, chegou a hora de realizarmos as mudanças que estão sendo propostas pelo Papa Francisco, sem medo de avançarmos para águas mais profundas.

 

Ao reler o Documento de Medellín, que foi a atualização do Concílio Ecumênico Vaticano II na América Latina e no Caribe, entendi que é preciso reafirmar O Pacto das Catacumbas, e agora o Pacto das Catacumbas pela Casa Comum, o método Ver-Julgar-Agir acrescido do Rever-Celebrar-Sonhar, a Opção pelos Pobres; que para muitos/as será a primeira experiência desse chamado do Espírito Santo que há cinco décadas ecoa por este chão continental semeado com o sangue dos/as mártires da caminhada no seguimento do Mártir Jesus de Nazaré. O Povo de Deus ainda continua andando no deserto, apesar dos ares primaveris trazidos pelo Papa Francisco, o papa vindo do fim do mundo. No Vaticano II a Opção pelos Pobres foi a opção de uma minoria clandestina capitaneada por Dom Helder Camara. Na Conferência de Medellín esta opção se tornou a opção de toda uma história da Igreja na América Latina e no Caribe, pois Medellín foi mais avançada que o Vaticano II. O resultado dessa ousadia profética: há medo do Vaticano II e há medo de Medellín. Há o medo de assumir as causas do Reino nas causas da vida. Dentro do espírito do Vaticano II, Dom Pedro Casaldáliga fez o poema Deus nos livre:

 

 “Deus nos livre

 de leigos

 com batina no espírito.

 Deus nos livre

 de padres

 sem Espírito Santo.

 Deus nos livre

 de espíritos

 sem a carne da vida”.

 

Irão dizer, e já estão dizendo que tudo o que aconteceu no Sínodo para a Amazônia é política, que é comunismo, diria Dom Helder Camara: “é Evangelho de Cristo!”

 

Sabendo que o Papa Francisco gosta muito de poesia, apresento um poeta cearense chamado Patativa do Assaré, que ao ser chamado de comunista durante a ditadura militar brasileira, por pessoas ditas “católicas” fez o seguinte verso:

 

“Me taxar de comunista

é um crime é um pecado

é atravessar a pista

cego, surdo e aleijado

se com sentimento nobre

o que defender o pobre

grande comunista é

pertencente a mesma lista

o primeiro comunista

foi Jesus de Nazaré!”.

 

Que a profecia nos inspire a fazer um Sínodo aggionarmento. Que possamos selar um Pacto pela Ecologia Integral, principalmente pela defesa da Vida.

 

Que Nossa Senhora de Guadalupe, Nossa Senhora da Conceição Aparecida, São Romero da América intercedam por nós junto a Jesus de Nazaré, e que Jesus fortaleça nossos pés, para as pedras que virão, fortaleça nossas mãos, para cuidar de quem está no chão, que fortaleça nossos lábios, para divulgar o Reino de Deus com respeito e diálogo, indo sem medo ao encontro do que é diferente. A diferença é o que fortalece a Igreja.

 

 

Amém. Axé. Awiri. Aleluia!

 

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