O Tempo e o Vento

27 de Setiembre de 2019

[Por: José Neivaldo de Souza]




Sêneca, filósofo romano, tutor e vítima das maldades do Imperador Nero, escreveu algumas cartas ao amigo Lucilio. Uma delas trata de conselhos para a vida, e nos ajudam a pensar sobre a fugacidade do tempo e o apego às coisas. Bela carta! Ele aconselha a não ignorar o tempo, mas cuidar dele. Que tempo? Temos a sensação de poder controlar tudo ao nosso redor: as coisas, as pessoas, a natureza e principalmente o tempo. É uma falsa sensação, pois ele nos escapa, sem nos avisar. 

 

De repente me dei conta que é setembro novamente. Ouvindo a música de Beto Guedes: “Sol de Primavera”, entendi que o tempo sobre o qual ainda temos algum controle não está fora de nós, mas dentro. É aquele que nos dá razão para viver e vontade de seguir adiante. Desperdiçamos tempo quando nos ocupamos com o trabalho que não gostamos; com a pessoa que não amamos; com as ideias que não acreditamos e com os amigos com quem construímos sonhos, mas não confiamos. Primavera é a metáfora de um novo tempo que brota de dentro. Apesar das tempestades, que parecem tudo destruir, os botões insistem em florir e os pássaros não desistem de cantar: “a boa nova anda nos campos”. 

 

É preciso cuidar do tempo. Que tempo? Este no qual tudo pode ser feito: o momento presente, o hoje. O ontem não nos pertencem mais e o amanhã, não ainda. Dalai Lama em seu tom humorado e sorridente diz: “hoje é o dia certo para amar, acreditar, fazer e principalmente viver”.

 

O futuro é o lugar da esperança, mas é também um “não lugar” onde depositamos as coisas inacabadas e o nosso desejo de realizá-las. Há anos protelamos uma leitura, um encontro, uma festa. O tempo passa e “Os Lusíadas” de Luis de Camões, apesar de estar nos planos de leitura, fica para um dia qualquer no futuro.       

 

Passam as horas, os dias, os anos e a vida se esvai. Olhamos para trás, o fantasma da morte nos persegue e nos vem o sentimento de que nada nos pertence, a não ser o tempo que perdemos com as coisas essências. “Foi o tempo que dedicaste à tua rosa que a fez tão importante”, dizia o Pequeno Príncipe à raposa. Rubem Alves diria que o “Antigamente é um tempo que se foi, mas que se recusa a ir de vez e fica dentro da gente, atormentando o coração com saudade”.  

 

O apego às coisas insignificantes é muitas vezes uma dedicação medíocre do nosso tempo, e nós não nos damos conta disso. Há um tempo para tudo: “Tempo de chorar, tempo de rir, tempo de prantear e tempo de dançar”, como escreveu o Eclesiastes (3,4). Que o choro não seja de lamentação pelas perdas passadas ou de angústia pelas expectativas futuras. Certo está o poeta Drummond ao dizer que é uma perda de tempo nos dedicarmos às coisas que não nos interessam, pois este precioso tempo, desperdiçado, teria mais valor se aplicado às coisas que de fato nos realizam.  

 

 

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