A beleza da sabedoria

12 de Setiembre de 2019

[Por: José Neivaldo de Souza]




Vivemos momentos difíceis! Há tempo venho esperando que as coisas deem certo. Observo as pessoas ao meu redor e me pergunto: o que elas pensam acerca do seu mundo e de si mesmas? Certamente a grande maioria projeta uma imagem diferente no se refere aos valores. Elas se preocupam em ganhar dinheiro, adquirir riquezas, poder, bons relacionamentos, mas sequer procuram o autoconhecimento. Sabedoria é poder enxergar o mundo com os olhos da alma. A sabedoria tem a sua beleza! Epicuro, Santo Agostinho, Tolstoi e Rubem Alves ensinam a arte da sabedoria, não porque se declaravam sábios, mas porque a perseguiam incansavelmente.   

 

As expectativas em relação ao futuro nos angustiam. Sabedoria é curtir intensamente o momento presente, pois é nele que vivemos, semeamos e muitas vezes, devido à ligeireza da vida, não colhemos o que plantamos. Alegria na semeadura! Mais do que produzir e ajeitar um mundo para as gerações vindouras, é preciso revisitar a alma e conhecer sua dor, seus medos e desejos, pois como escreve Rubem Alves: “O olho vê aquilo que o coração deseja. Quando o desejo é belo, o mundo fica cheio de luz, mas quando o desejo é ruim, o mundo se entristece”1.

 

Tempus fugit! É preciso escolher o essencial ainda que tenhamos de “abrir mão” de coisas e pessoas. Epicuro, filósofo grego do século III a. C., observou que o sábio vive “já” o que a maioria das pessoas esperam para o futuro: uma vida feliz. Ao voltar-se para dentro, ele possui uma visão crítica dos próprios desejos e, por isso, é capaz de direcionar toda a sua escolha ou recusa para a saúde do corpo e a serenidade do espírito. Por isso aconselha em sua Carta sobre a Felicidade: “ninguém hesite em se dedicar à sabedoria enquanto jovem, nem se canse de fazê-lo depois de velho, porque ninguém jamais é demasiado jovem ou demasiado velho para alcançar a saúde do espirito”2. Prudência, beleza e justiça são, para Epicuro caminhos de sabedoria,  mas o que a maioria entende sobre estes caminhos?  

 

Santo Agostinho não está longe de Epicuro, apesar de sete séculos de distância, o filósofo de Tagaste entendia que sabedoria é voltar-se para si mesmo. É nesta viagem para a alma que o sábio “percebe o espírito” que o habita e passa a olhar o mundo a partir desta ótica. Mas, nem todas as pessoas conseguem esta proeza, estão cegas e surdas ao espírito. Baseado em sua experiência de vida, Agostinho lamenta ter percebido tardiamente a beleza interior:

 

Tarde te amei, ó beleza tão antiga e tão nova! Tarde demais eu te amei! Eis que habitavas dentro de mim e eu te procurava do lado de fora! Eu, disforme, lançava-me sobre as belas formas das tuas criaturas. Estavas comigo, mas eu não estava contigo. (...) Tu me chamaste, e teu grito rompeu a minha surdez. Fulguraste e brilhaste e tua luz afugentou a minha cegueira. Espargiste tua fragrância e, respirando-a, suspirei por ti. Eu te saboreei, e agora tenho fome e sede de ti. Tu me tocaste, e agora estou ardendo no desejo de tua paz3

 

Para Agostinho, no conhecimento de si chegamos próximo ao conhecimento de Deus, a perfeita sabedoria. O sábio não atribui a Deus o que é incompatível com a justiça e uma vida feliz. A maioria das pessoas produz uma falsa imagem do sagrado. Falta de sabedoria não é rejeitar esta imagem, mas atribuir a Deus os juízos equivocados que a maioria faz dele. Cega e surda à sabedoria que se revela no seu interior, a maioria toma o mal como bem, o injusto por justo, o medo por coragem e a morte por vida.    

 

O escritor russo Lev Tolstoi conta que “Quando, na Antiguidade, alguém queria matar um urso, pendurava uma pesada tora de madeira em cima de uma vasilha com mel. A tora voltava e o atingia. O urso ficava irritado e empurrava a tora com mais força ainda, e essa o atingia por sua vez com mais força, isso continuava até o urso ser morto”4. Esta estória ilustra o que procuro dizer sobre a sabedoria. Muitas vezes a maioria age como o urso que, voraz às necessidades básicas, sacrifica a própria consciência. Volto a Epicuro que diz: “é preferível ser desafortunado e sábio, a ser afortunado e tolo; na prática, é melhor que um bom projeto não chegue a bom termo, do que chegue a ter êxito um projeto mau”5

 

Citas:

 

 ALVES, Rubem. 300 Pílulas de Sabedoria. São Paulo: Planeta, 2015, p. 170. 

2 EPICURO. Cartas sobre a Felicidade. São Paulo: Unesp, 2002, p. 21. 

3 AGOSTINHO, Santo. Confissões. 3ª. Ed. São Paulo: Paulinas, 1984, p. 277. 

4 TOLSTOI, Leon. Pensamentos para uma vida feliz. São Paulo: Prestigio, 2005, p. 26. 

5 EPICURO, 2002, p. 51.

 

Imagen: https://cuevadecronos.com/nuevo-renacimiento/ 

 

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