28 de Febrero de 2019
[Por: José Neivaldo de Souza]
Este escrito, longe de ser uma confissão de pecados, é a expressão de um pensamento acerca de uma paixão antiga: a luxúria. Diante desta busca desenfreada de prazer, ligada à sexualidade, causadora de êxtase e frustração, perguntamos: o que fazer? A luxúria é uma emoção que provoca, ao mesmo tempo, dois sentimentos: o doce sabor da liberdade e o amargo gosto da servidão.
O doce sabor da liberdade. Nos sentimentos encontramos a liberdade, dizia o poeta alemão J. Goethe. Neles a alma expressa o seu desejo vital: o de ser livre e feliz. Mas o sentimento, sem o crivo da razão, pode levar à libertinagem e a práticas sexuais perversas. O perverso se orgulha de suas aventuras amorosas e, para ele, só há encantos na “carne”. O prazer traz a sensação de liberdade e intensidade. Quanto mais se tem, mais se quer! Fechando os olhos à realidade, procura convencer a si e aos outros da legalidade de suas práticas. Uma vez convencido, o outro torna-se um objeto a ser usado e descartado. O libidinoso não aceita um “não” como resposta, preso e perdido nesta ansiedade, ele segue em frente sem perceber o abismo que lhe aguarda.
Na Bíblia há várias narrativas acerca da luxúria e uma delas está no Antigo Testamento. Amnon, filho de Davi, se apaixonou pela irmã, Tamar e tanto fez que a transformou em objeto de seu prazer. Uma vez satisfeito e insatisfeito, ele a desprezou (2 Sam. 13, 1-20). No Novo Testamento, num contexto onde predominava o machismo e sexismo, crianças e mulheres eram comumente exploradas, abusadas e descartadas. São Paulo chegou a escrever à comunidade de Coríntios (1Cor 5,1): “Ouve-se dizer constantemente que se comete, em vosso meio, a luxúria, e uma luxúria tão grave que não se costuma encontrar nem mesmo entre os pagãos: há entre vós quem vive com a mulher de seu pai!”. Jesus voltando-se contra os preconceitos, ensina como o salmista (Sl 26, 2-3) que a pureza de espírito começa no coração e na mente onde se dão os passos para uma transformação ética na sociedade. Jesus abençoou as crianças, percebidas como “sedutoras”, pelos pedófilos da época: “Deixai vir a mim as crianças, pois delas é o Reino dos Céu...” (Mt 19, 14). E as mulheres, vítimas de uma lei perversa, que absolvia adúlteros, disse Jesus: “Quem entre vós está sem pecado? Então que seja o primeiro a atirar pedras contra esta mulher” (Jo 8,7).
O amargo gosto da servidão. Só sente isso quem, com a alma inquieta, toma consciência de sua perversão e procura lidar com suas paixões. M. Gandhi, diferente de Goethe, entendia que a liberdade não suporta a fraqueza de sentimentos. A luxúria é uma fraqueza e precisa ser enfrentada por uma arma mais forte: a razão. Numa sessão de análise um paciente relatou o seu drama. Ele se entregara à luxúria! Não conseguia dominar suas paixões, particularmente aquelas direcionadas à sexualidade ou “impulsos sensuais”. Na sua juventude, a luxúria era apenas uma semente, quase infértil. Com o tempo ela foi se transformando e, agora na idade adulta, tornou-se uma frondosa árvore com raízes gigantescas e profundas no corpo. Em tom religioso e parafraseando o apostolo Paulo (Gl 2,20) ele disse: “já não sou eu quem vive, mas as paixões vivem em mim”. Dizendo-se cego implorava a visão. Consciente de que havia se tornado um escravo das paixões, buscou ajuda. Queria alguém que o ajudasse a purificar seus olhos a fim de enxergar o essencial, além da “carne”.
O que fazer com a “luxúria nossa de cada dia”? É um caminho sem volta para aqueles que não se enxergam, mas um caminho com saídas para aqueles que procuram se libertar de suas próprias correntes. Para estes, é preciso acolher um trabalho que ajude a se questionar. Tirar os galhos que ofuscam a visão a fim de perceber claramente a situação de libertinagem, muitas vezes entendida como liberdade; refletir à luz da espiritualidade cristã, as palavras do Mestre Jesus sobre esta determinada situação e procurar agir de tal forma a dominar as próprias paixões que insistem, a todo tempo, a nos escravizar.
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