O comportamento político à luz da psicanálise

04 de Octubre de 2018

[Por: José Neivaldo de Souza]




Se alguém não pede para ser psicanalisado, e não paga por isso, qualquer diagnóstico de um especialista será, como dizia Sigmund Freud, “selvageria”. Por outro lado, os estudiosos da psicanálise, com liberdade, podem fazer uma análise da situação sócio-político em que está vivendo, sem que para isso seja requisitado. É como cidadão e estudioso da psicanálise que exerço o direito de emitir meu parecer acerca do momento político e provocar uma reflexão sobre o comportamento dos candidatos.  

 

Freud dizia que as pulsões, de vida e morte, são inconscientes e elas deveriam ser direcionadas à duas fontes saudáveis à civilização: o amor e o trabalho. Há três estruturas psíquicas, analisadas pelo Pai da psicanálise e aprofundadas por Jacques Lacan, a serem tratadas e orientadas à preservação da vida. São elas: neurose, psicose e perversão. 

 

A neurose é uma estrutura psíquica e como tal pode se apresentar como transtornos em pessoas que, apesar de conscientes da realidade que as cerca, reagem de forma incontrolada a certos acontecimentos. Não cabe aqui fazer uma lista de neuroses, me proponho analisar a neurose do abandono. O que? E o que deseja o neurótico abandônico? ele padece do sentimento de abandono e, por isso está sempre a procura de quem o ampare. Deseja que o desejo do outro seja cumprido nele, já que por insegurança ou medo, não consegue realizar os seus próprios desejos. Este tipo de relação com o outro, mesmo fantasiosa, sofre por medo do abandono e da morte. É um sentimento perturbador! Ao se deixar escravizar por expectativas colocadas fora de si, o abandônico age como uma massa de manobra nas mãos de quem procura levar vantagem em tudo.

 

A Psicose, diferente da neurose, é um estado psíquico em que a pessoa perde o contato com a realidade. Sem esta consciência da realidade, ela vive de alucinações e, muitas vezes, é acarretada por atitudes antissociais. Estas atitudes podem ser ideias desconexas, crença em seus delírios persecutórios ou em seus poderes especiais, alucinações auditivas (se religiosa ouve a voz de Deus) e visuais.   

 

A Perversão se demonstra como transgressora da lei e da ordem social. A palavra francesa “Perversion” quer dizer aversão ao pai. O pai como representante da ordem, da lei. O perverso tem consciência da realidade, sabe o que é certo e errado, mas como vive pela autossatisfação, o seu compromisso é a transgressão ao outro. Burla as normas estabelecidas, desviando-se do caminho natural das coisas, cria o seu próprio caminho. É neste desvio que ele aposta toda sua força. O perverso é narcisista! Ele acredita nas próprias mentiras utilizando-se delas para enganar e conquistar o que almeja. Ele acredita piamente que não há outra pessoa, melhor do que ele, que tenha a solução para ordenar o que ele imagina desordenado. Para ele, a sociedade perderia muito se não reconhecesse suas capacidades. Sem sentimento de culpa, ele manipula, seduz e busca o poder a todo custo entendendo que o fraco, o preguiçoso, o malandro é sempre o outro que precisa ser eliminado em favor de uma sociedade mais limpa, segundo os seus critérios. Ele nunca se vê neste quadro.

 

Para alguns psicanalistas a estrutura perversa se fortalece na infância e perdura por toda vida. Ela se formou na “não-castração” uma fase desfavorável à consciência dos erros e da culpa. Ao contrário do neurótico, que vê seu desejo a ser realizado “pelo” outro, o perverso vê seu desejo realizado “no” outro. O outro passa a ser mero objeto. Tanto o neurótico quanto o perverso entendem que “o desejo do forte se realiza no fraco”. Não há contestação nesta afirmação.  

 

Esta teoria foi ilustrada por Freud com o mito de Narciso, um homem cuja beleza não podia ser refletida. Um dia ele se viu na flor d’água e, apaixonado por sua própria imagem, se afogou nela. A visão de mundo narcisista parte da visão do “Eu” absoluto que, na tentativa de preservar a própria vida, com a eliminação do outro, acaba por eliminar a sim mesmo. 

 

Estas estruturas, mencionadas acima, podem encontrar na religião e na política instâncias de poder que as ajudem a se relacionarem de forma doentia. O neurótico abandônico, por exemplo, cuja necessidade de segurança faz com que deposite em um outro a capacidade de eliminar aquilo que o ameaça, encontra no perverso o seu herói, o seu modelo. Por outro lado, diante de uma multidão de neuróticos, cuja vida é desorientada pelo medo e a insegurança, o perverso exerce o seu mandato. Um neurótico abandônico pode dizer: “tal líder vai nos trazer segurança, ainda que transgrida meus direitos e os direitos humanos, vale a pena a renúncia”. Nesta relação, neurótico e perverso vivem uma situação de dependência; uma felicidade ilusória, pois numa perspectiva religiosa, o salvador exige um sacrificio que muitas vezes custa a própria vida. 

 

Imagem: http://spm.mx/home/diversidad-y-psicoanalisis/ 

Procesar Pago
Compartir

debugger
0
0

CONTACTO

©2017 Amerindia - Todos los derechos reservados.