Corrupção, o espírito a ser expulso

04 de Enero de 2018

[Por: José Neivaldo de Souza]




As notícias sobre corrupção, na política, na economia e até mesmo na religião, têm afetado a credibilidade na liderança, desencadeando uma grave crise institucional. Isso nos assusta, nos incomoda e nos desanima. É uma corrupção sistêmica, vai desde o desvio de verbas públicas, destinadas à saúde e educação, ao custeio de campanhas eleitorais por empresas privadas interessadas no poder. São muitos os elos desta corrente e, cada vez mais elas vão se quebrando, na medida em que os tribunais de justiça, juntamente com as investigações da Polícia Federal, pressionam às “delações premiadas”. Há os que, ainda sob investigação, continuam arrombando os cofres públicos.

 

A corrupção sempre existiu e Santo Agostinho a atribuí ao pecado original. Se não há como extirpá-la, já que nem mesmo a Dinamarca conseguiu, apesar de ter a menor percepção de corrupção no setor público, pelo menos expulsá-la. A corrupção é malquista, pois é nociva à saúde psíquica, social e espiritual.

 

O relatório da ONG “Transparência Internacional”, publicado no site da EXAME, mostrou que em 2016 “a corrupção sistêmica e desigualdade social reforçam uma à outra, levando à falta de confiança popular nas instituições políticas e gerando um solo fértil para o crescimento do populismo”. Alguns políticos, candidatos à próxima eleição presidencial, prometem acabar com a corrupção, mesmo estando ligados à venda de votos no congresso nacional e lavagem de dinheiro. 

 

O Brasil é um dos países que mais subiu no ranking da corrupção nos últimos anos. Talvez esteja ligado a uma fase pós-ditatorial, onde o liberalismo político-econômico tornou-se sua principal plataforma, desconsiderando a fragilidade dos Estados. Ele vê na aceleração do desenvolvimento a solução para a riqueza e, tudo isso, encaixando-se numa moral da impunidade, “coisa muito nossa” como diria o humorista Jô Soares. 

 

Há um desencanto, não só em relação às lideranças políticas, mas também às autoridades religiosas. Pesquisas do Índice de Confiança Social (ICS) do IBOPE confirmam este descrédito. Qual o papel do cristão diante de tal enfermidade? O espírito de corrupção se expande e os cristãos, à luz do Espirito Santo, revelado por Jesus Cristo, têm autoridade para expulsá-lo.  

 

Há uma cena, no evangelho de Mateus (10,1-42), que me chama atenção. Procuro interpretá-la a partir de uma hermenêutica da esperança e da justiça. Jesus reúne os amigos e, conferindo-lhes o poder de expulsar os espíritos imundos e curar as enfermidades, os envia em missão. Os discípulos devem se desapegar de tudo, até mesmo do que lhes é mais necessário. O Mestre os envia como ovelhas entre os lobos. Que missão perigosa! Eles encontrarão pela frente, mesmo entre os próprios familiares, gente que faz da corrupção sua plataforma de vida. Esta missão se fará entre religiosos, políticos e cidadãos comuns da “casa de Israel”. Há ali um espírito imundo adoecendo as instituições e a sociedade. A religião, atrelada ao poder despótico romano, contribui para isso.  Os discípulos renunciarão e denunciarão este espírito a fim que seja expulso e um novo Reino, justo e saudável, se estabeleça: “Não vim trazer a paz, vim trazer a espada”

 

Ao caráter irascível de seus discípulos, o mestre propõe duas virtudes fundamentais a esta missão: “sejam astutos como as serpentes e mansos como as pombas”. Astúcia é o mesmo que prudência, capaz de prevê o que vem pela frente. Todos estamos sujeitos, por herança ou hábito, à corrupção, mas pela astúcia, percebemos qual é o momento e o lugar certo para reagirmos. O filósofo Baltasar Gracián escreveu que o astuto, ao encontrar um insensato, deve “evitar ser o segundo”. Píndaro, um poeta grego do século V a. C., dizia que para evitar se corromper precisa-se a força de um leão e a astúcia de uma serpente

 

A mansidão torna leve a relação com o próximo. Repreender alguém que se deixa corromper é também uma forma de solidariedade. Mas, isso pode ser feito de forma branda, meiga e suave. Mansidão não é sinônimo de ignorância ou cumplicidade nas amizades, mas sabedoria na relação com todos os seres vivos. Na Carta aos Gálatas (5,22-23) São Paulo coloca a mansidão como um dos frutos do Espírito. 

 

Astúcia e mansidão consistem na forma com que uma pessoa se relaciona com os seus medos e com os perigos que lhe estão à espreita. Como cristãos, o nosso papel é seguir o Mestre. Renunciar ao espírito de corrupção, denunciá-lo e expulsá-lo de dentro de nós, é a primeira atitude a ser tomada, já que ele começa por ofuscar nossos próprios valores. A segunda atitude é expulsá-lo do meio onde vivemos, ainda que seja na própria confissão religiosa, pois há valores os quais não podemos negociar com o inimigo.    

 

 

Imagem: http://cultura.culturamix.com/blog/wp-content/gallery/a-politica-e-a-corrupcao-brasileira-4/A-Pol%C3%ADtica-e-a-Corrupção-Brasileira-8.jpg

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